Regularização de rádios
comunitárias é questão de vontade política
Como
avalia a atuação da Anatel no caso?
Na reunião de negociação nós questionamos o papel da Anatel. Ela tem
outras coisas muito mais importantes para fazer. O STF (Supremo Tribunal
Federal) proibiu que a Anatel fizesse busca de equipamento de radiodifusão, e o
entendimento da Defensoria Pública da União é de que não existe apreensão sem
busca; o transmissor não apareceu lá no escritório da Anatel, ela foi fazer uma
busca e conseguiu encontrar de onde a rádio estava sendo transmitida. Então,
segundo entendimento da defensoria pública, essas ações da Anatel são ilegais.
Qual a situação da legislação sobre as rádios comunitárias?
As rádios comunitárias têm uma lei de 1998 (Decreto 2615, para a Lei
9742/97) que é muito ultrapassada. Ela foi uma lei feita pelos empresários para
que as rádios comunitárias não significassem uma concorrência. Ela é uma lei do
pior momento do governo Fernando Henrique Cardoso, que foi o momento das
privatizações, da entrega do patrimônio brasileiro para a iniciativa privada
estrangeira, que foi ali entre 1997 e 1998. Essa lei reflete esse momento da
democracia brasileira, que era diferente do que a gente tem hoje.
É preciso mudar essa lei. Ela traz uma série de amarras. Ela burocratiza
a questão da legalização das rádios comunitárias, então hoje grande parte das
rádios comunitárias está na ilegalidade por conta dessa lei. E algumas rádios
comunitárias acabam sendo controladas por políticos, por grupos religiosos,
porque eles têm o controle econômico e político de uma situação que requer
contratação de advogados, de funcionários. E que uma comunidade sem dinheiro,
sem poder captar através de publicidade, ou de outras fontes de recursos, como
o Fundo Público, voltado para isso, ou o percentual de um imposto, como é o
Fistel (fundo de Fiscalização das Telecomunicações), ou do Fust (Fundo de
Universalização dos Serviços de Telecomunicações), para financiar rádio
comunitária, fica impossibilitada e alguns grupos políticos ou religiosos
acabam se aproveitando para controlar essa concessão de rádios comunitárias. E
também é preciso fiscalizar para que a concessão sirva à comunidade e não a
interesses pessoais, econômicos e políticos.
A gente precisa avançar, porque a rádio comunitária tem que ser vista
como um ator importante na questão da comunicação pública, que hoje está se
fortalecendo com a EBC, as rádios Nacional e MEC (Ministério da Educação e Cultura),
as rádios públicas estaduais, a TV Brasil e a rede pública de televisão. E as
rádios comunitárias fazem parte desse processo, então elas precisam ser
tratadas e reconhecidas com a importância devida, e hoje não têm.
A portaria 1462, de 2011, não mudaria esse panorama?
Não. A norma 462 na verdade regulamenta essa lei de 98. Então você
regulamentar uma lei que é ruim, você só intensifica o grau de perseguição, o
grau de burocracia, o grau de desimportância que o poder público está tendo com
as rádios comunitárias. Ela trouxe uma maior transparência nos processos, que
na verdade é uma condição que o estado deveria dar sempre, e que até hoje não
tinha, por exemplo, na disputa por uma freqüência.
Há como mudá-la?
A norma 1462 foi um retrocesso. Os movimentos
sociais reclamaram tanto a Abraço (Associação Brasileira de Radiodifusão
Comunitária), como a Amarc fizeram mobilizações e agora o governo está com uma
proposta de alteração da norma. Esse processo está na Casa Civil e toca em
pontos que para o movimento são muito importantes. Um exemplo é a autorização
de publicidade comercial, desde que essa publicidade seja do comércio local e
desde que não sejam veiculados os preços e condições de pagamento. E a rádio
comunitária é muito importante para incentivar o comércio local, porque o
pequeno comerciante não consegue anunciar na grande rádio (NR: No Rio de
Janeiro, por exemplo, média de R$ 700 por 30 segundos de veiculação). Então
quem tem acesso aos meios de comunicação vai comprar nas grandes lojas, e o
comércio local fica enfraquecido. A rádio comunitária é um espaço para fazer
essa economia local girar.
Arthur William - por Rodrigo Otávio
Observatório do Direito à Comunicação /
Carta Maior
Da redação: Abraço - RO
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